Eclipse
Março 06, 2007
valordascoisas
E eis que chegou a loucura.
Os homens e mulheres presentes vibraram num misto de medo e emoção. Nunca tal tinham visto. A sua querida lua que sempre os acompanhou todas as noites estava "partida". Não o pronunciaram mas o pensamento era comum. «Como teria sido isso possível? Que tinham eles feito que tinha enfurecido os deuses? Como reparar o erro se não sabiam onde tinham errado?!»
Sim. Sabiam o que tinham feito. Sabiam e não conseguiam enfrentar a verdade. Tinham aceite que Morgause se afastasse. Não sabiam porque é que ela o tinha feito. Era um assunto só dela. Nunca o contou a ninguém mas era evidente que alguma coisa estranha se passava com ela...
Entretanto, afastada dos amigos e observadora atenta estava Morgause. Um sentimento de vazio preenchia-lhe o coração já de si enfraquecido. Olhava com espanto a Lua e olhava com inquisição aquele grupo. Ela sabia que era apenas um fenómeno comum do Universo. Já a sua bisavó no recolher da tarde, enquanto preparava uma mistura de ervas com a qual costumava tratar as suas feridas de brincadeira de criança lhe contava histórias de horror vivido quando mais nova, em que o dia se tornou noite e em que a noite iluminada ganhou misteriosas sombras.
Mas o seu pensamento estava longe, muito longe dali... E no entanto, estava à sua frente. Arthur estava no meio deles. Ela sabia disso. Mesmo que não o conseguisse ver claramente devido à pouca iluminação ela sentia-o ali. Nunca fora capaz de lhe dizer como o seu dia cinzento ficava colorido sempre que o via. E como o amava…
Sofria. Sofria sozinha até o seu coração já não conseguir aguentar mais de emoção e ter de abandonar a quem mais queria. Não conseguia suportar. Não suportava vê-lo sempre bem acompanhado. Ele era uma pessoa excepcional e cativava multidões de mulheres e homens que com ele queriam conferenciar. Mas o que mais lhe custava observar eram as belas mulheres a quem ele sorria descaradamente. Especialmente a Guinevere que modestamente se tinha tornado amiga dos dois e parecia ofuscar com a sua presença o olhar de Arthur.
Que podia Morgause fazer? Impor a sua presença sempre que Arthur e Guinevere estavam juntos? Não. Ainda que o fizesse algumas vezes, o sentimento de dor que sentia sempre que os via reunidos tornava-se insuportável. Os dias para ela foram passando e a sua dor foi crescendo.
Tinha de fazer alguma coisa.
Fugiu. Despediu-se deles com um «Boa noite» tremido e abandonou a cidade e todos os seus amigos.
Agora, passados alguns anos regressou. Regressou na noite em que a terra ocultou a lua. Não o tinha previsto. Não controla os astros como algumas mentes mais pérfidas podem pensar dela. É apenas uma mulher. Uma mulher que ama e que ama de todo coração. Uma mulher que decidiu enfrentar os seus medos e fazer a vontade do seu coração. Ia ter com Arthur.
Ia ter com Arthur.
Foi até ele e encontrou-o de um modo que de alguma maneira já imaginava. Risonho e feliz. Guinevere estava com Arthur. Viviam juntos.
Uma enorme satisfação invadia-a. Tudo o que tinha passado, toda a dor que tinha sentido já não sentia da mesma forma. Agora sim, Morgause tinha a certeza de ter ultrapassado todas as dificuldades com que se tinha deparado nos últimos anos.
- Fiz bem em voltar! – Disse para ela própria. - Agora posso evoluir para a minha forma natural, para a construção da minha liberdade.
Seu coração não chorou mais. Simplesmente começou a bater e a sonhar outra vez.
Nesse instante a Lua ficou quase tão brilhante e com tanta luz que iluminou o seu caminho.
Morgause decidiu começar de novo. Decidiu, mas decidiu de coração leve…
Ora digam lá, se não tenho uma veia poética
Por valordascoisas